VOL. 7 | N.º 3 (VOLUME ESPECIAL)

Apresentação

Maria Lúcia Bueno, Marcelo Ribeiro Vasconcelos, Sabrina Parracho Sant'Anna

DEBATES ENTRE SOCIOLOGIA E HISTÓRIA DA ARTE. AMÉRICA DO SUL E BRASIL EM PERSPECTIVA

 

Artigos

COLEÇÕES DA VISCONDESSA DE CAVALCANTI. UM LEQUE DE AUTÓGRAFOS E A PRESENÇA DE PORTUGUESES

Maraliz de Castro Vieira Christo

O artigo apresenta alguns aspectos das coleções de Amélia Machado Cavalcanti (1852-1946), viscondessa de Cavalcanti a partir de 1888, presentes no acervo do Museu Mariano Procópio. Centramo-nos na coleção de 68 autógrafos de célebres escritores, artistas, músicos, atores, cientistas, exploradores e políticos de seu tempo, apostos em um leque, entre 1890 e 1945. Dada à sua amplitude, destacamos a presença dos portugueses: Abílio Manuel Guerra Junqueiro (1850-1923), Anthero de Quental (1842-1891), Eça de Queiroz (1845-1900), Joaquim Pedro de Oliveira Martins (1845-1895), Ramalho Ortigão (1836-1915), Alexandre de Serpa Pinto (1846-1900), Raphael Bordallo Pinheiro (1846-1905) e Arthur Napoleón (1843-1925).

O PERCURSO DA COLEÇÃO SPANUDIS. DO MUSEU DOMÉSTICO AO MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA DA USP

Maria Izabel Branco Ribeiro

O psicanalista grego, poeta e crítico de arte Theon Spanudis chegou a São Paulo em 1950. Iniciou sua coleção de arte brasileira com Casas de Itanhaém, 1948 de Alfredo Volpi. Em 1979 doou para o Museu de Arte Contemporânea da USP 453 obras de arte, assinadas por 35 artistas, entre eles: Volpi, Sacilotto, Mira Schendell, José Antonio da Silva, Eleonore Koch e Rubem Valentim. A maior parte delas apresenta estrutura bem definida e tendência à bidimensionalidade, independente se figurativas ou abstratas. São exemplares do conceito de construtivismo formulado pelo proprietário. Em outras palavras, são obras de arte com organização formal e potencial fabulador, passíveis de apreensão intuitiva pelo observador e propiciadoras de experiências estéticas que identificava como próximas da “religiosidade sem ritos e mitos”.

ARTES INDÍGENAS NO MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO

Ilana Seltzer Goldstein e Vitória Oliveira Machado

Esse artigo explora a inserção e exibição das artes indígenas no Museu de Arte de São Paulo (MASP), com foco na última década. Com a reabilitação dos cavaletes de vidro de Lina Bo Bardi em 2015, e a inclusão de segmentos antes marginalizados, o MASP consolidou seu compromisso com a diversidade cultural, especialmente em suas exposições temáticas. O museu passou a convidar artistas, intelectuais e curadores indígenas para participar de seminários e exposições. O texto analisa mostras como "Histórias Indígenas" (2023), reunindo obras de vários países sob curadoria indígena, e discute como trabalhos indígenas são exibidos na mostra de longa duração do MASP, junto a pinturas renascentistas e modernistas. Resultados preliminares apontam a necessidade de revisão e ampliação dos modos de participação de artistas e pensadores não-hegemônicos nas decisões do museu.

ADRIANA VAREJÃO, ERNESTO NETO E A ARTE CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA. ANOTAÇÕES INCOMPLETAS

Glaucia Villas Bôas

Neste artigo, comparo as obras e os discursos de Adriana Varejão e Ernesto Neto, brasileiros pertencentes a uma bem sucedida geração de artistas da arte contemporânea. Indago pelas noções de passado, presente e futuro que se inscrevem nos seus trabalhos e como a temporalidade singular de suas obras se associa ao teor da missão que atribuem à arte. Minha hipótese é de que na passagem da arte moderna para a arte contemporânea, descartou-se a prerrogativa de a arte imaginar/fantasiar um só futuro, porém, manteve-se a pretensão de aproximá-la do espectador. A política de aproximação da arte, contudo, sofreu tal reviravolta que não se trata mais, tão somente, de despertar os sentimentos do espectador ou torná-lo um ser dotado de sensibilidade, mas, efetivamente, de convidá-lo à participação política.

MULHERES ARTISTAS E ESPAÇO PÚBLICO. POSSIBILIDADES POÉTICAS DE ENFRENTAMENTO DA CIDADE

Fernanda Pequeno

Anna Bella Geiger (Rio de Janeiro, 1933), Livia Flores (Rio de Janeiro, 1959) e Lygia Pape (Nova Friburgo, 1927-Rio de Janeiro, 2004) são três mulheres artistas atuantes no Brasil. Oriundas de gerações distintas e com trabalhos diversos, no texto abordamos obras e proposições que confrontam o Rio de Janeiro e também a sua região metropolitana. Tomar o espaço público com seus corpos, os de seus estudantes ou para propor apreensões críticas da cidade é o que une as três artistas aqui elencadas. Circumambulatio, Espaços Imantados, Inserção em retrovisão e Rastreamento do Rio Morto (Passa batido, mas não despercebido) foram realizados entre 1968 e 2010 e abordam o Rio de Janeiro a partir de uma perspetiva poética, mas não purista. Os quatro trabalhos elencados não aludem a uma cidade turística, do cartão-postal, mas apontam uma relação cotidiana com a urbe, conotando enfrentamentos do espaço público da capital carioca em distintos momentos de sua história.

 

Registos de Pesquisa

A DESCONSTRUÇÃO DO OLHAR NA ARTE E NA CULTURA VISUAL. UMA RESENHA DO LIVRO MODOS DE VER

Júlia Almeida de Mello

Resenha do livro Modos de ver (Ways of Seeing), de autoria do crítico de arte britânico John Berger, publicado pela primeira vez em 1972, em decorrência do programa televisivo homônimo da British Broadcasting Corporation. Londres: Penguin Books. A versão mais recente traduzida para o português foi publicada em 18 de janeiro de 2023 pela Fósforo Editora (São Paulo).

 

O CORPO FEMININO NAS NUANCES DO NU E DO DESPIDO. UMA RESENHA DO LIVRO THE FEMALE NUDE: ART, OBSCENITY AND SEXUALITY

Júlia Almeida de Mello

Resenha do livro The female nude: art, obscenity and sexuality. 1 ed. Londres: Routledge, 1992, de autoria da historiadora da arte Lynda Nead.

 

 


VOL. 7 | N.º 2

Apresentação

Paula Guerra 

RETÓRICAS (DENÚNCIAS) DO INVISÍVEL. MEMÓRIAS, IDENTIDADES, ESPAÇOS E RESGATES

 

Artigos

PERIODISMO ALTERNATIVO Y MÚSICA POPULAR. REPRESENTACIÓN, MEMORIA Y CONSTRUCCIÓN DE UN LUGAR PROPIO

Josep Pedro
Este artículo explora el desarrollo del periodismo alternativo en las escenas musicales contemporáneas a partir de la investigación etnográfica de la escena de blues en Madrid. Examina tres casos de estudio representativos del periodismo alternativo ciudadano, cuyas actividades de publicación, documentación y producción radiofónica, audiovisual y cultural permiten apreciar la evolución de la escena y el desarrollo de movimientos asociativos. En respuesta a la falta de atención por parte de los medios tradicionales, los periodistas alternativos de blues exponen la importancia de que los ciudadanos se sientan o no representados en las agendas de los medios y en el tratamiento de temas y eventos que les atañen
cotidianamente. Las prácticas de periodismo alternativo observadas proporcionan contextos dialógicos en los que los participantes construyen sus identidades musicales y generan gradualmente un archivo sobre su historia y memoria, tratando de obtener mayor capacidad de acción y responsabilidad sobre sus vidas.

GEORREFERÊNCIAS ESTÉTICAS E CRÍTICO-DECOLONIAIS (DO FEMININO) NA OBRA DE YINKA SHONIBARE

Maria de Fátima Lambert

As revisitações historiográficas da Arte Ocidental servem propósitos poiéticos, subsumidos a compromissos ideológicos. Yinka Shonibare (1962-) desconstrói, na cronologia europeia, mentalidades revestidas por tecidos Dutch Wax, desconstruindo estereótipos ocidentais; problematiza conceptualizações mediante a ativação de arquétipos em prol de novas consignações. Focando as estéticas feminista e decolonial, abordamos tópicos iconográficos privilegiados, destacamos as figurações femininas, para explicitar quais as tipologias (iconográficas e semânticas) a que aplica os tecidos Dutch Wax – como emblema disruptivo. Que fundamentos subjazem nas suas transposições, operacionalizando sistemas que entrecruzem o decolonial e o feminista? Que modelos propõe e institui? Que paradigmas se mapeiam e/ou são tácitos? Consideram-se séries que remetem para: figuras históricas do Império Britânico; aristocratas e Iluminismo Francês; mitologia grega na estatuária greco-romana; alegorias e simbologias; obras-primas da historiografia europeia, entre outras. Atenta-se às motivações de Shonibare, ao recriar conjuntos tridimensionais (instalações), pela via da encenação performática, destacando The Progress of Love.

FESTAS DO POVO. SIGNIFICAÇÃO HISTÓRICA DE FESTAS POPULARES EM BAIRROS DE PERIFERIAS DO NORDESTE DO BRASIL

Marcelo de Sousa Neto

A cidade de Teresina, capital do estado do Piauí, Brasil, é um aglomerado urbano relativamente jovem, figurando, entre as capitais brasileiras, como uma daquelas que tem a história mais recente de sua formação. No esteio das transformações urbanas experenciadas pela capital, destacou-se a formação de grandes bairros, a exemplo do Itararé, na região sudeste da capital. O presente trabalho se detém especificamente sobre a formação do “Grande Dirceu”, como ficou conhecido o bairro Itararé e uma miríade de bairros e vilas que orbitam ao seu derredor. As discussões do trabalho são desenvolvidas a partir de uma questão central: como as comemorações coletivas do “Grande Dirceu” podem ser historicamente apropriadas para a ver o processo de formação histórica da região sudeste da cidade? O trabalho parte do pressuposto de que a festa constitui uma linguagem simbólica através da qual se pode traduzir os valores existenciais de uma comunidade.

CRIA(R)TIVIDADE TRANSDISCIPLINAR. RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA ENTRE A ILUSTRAÇÃO E A SOCIOLOGIA.

Susana Januário e Susana Lopes da Silva

A propósito do entendimento sobre a pertinência da transversalidade na construção de conhecimento e, sobretudo, da importância da reflexividade como dimensão necessária para a construção conscientizante do processo de aprendizagem, procurou-se retomar uma ação pedagógica, anteriormente experimentada, assente na articulação de duas unidades curriculares da licenciatura em Artes Visuais e Tecnologias Artísticas da Escola Superior de Educação do Politécnico do Porto (Araújo, Lopes e Carvalho, 2021). O desafio lançado pelas docentes das UCs de Ilustração e Sociologia da Arte consistiu na representação criativa (ilustração) sob o mote alusivo à celebração dos “50 anos menos um” da revolução democrática de 25 de Abril de 1974. Tendo como inspiração os modelos de pesquisa arts-based research (Greenwood, 2019; Finley, 2005) e A/r/t/ography (Irwin, 2004; Dias, 2013), procurou-se incentivar processos de pesquisa, de reinterpretação e de produção de significado (Belliveau, 2005), por forma a potenciar-se a inter-relação entre o fazer criativo e a construção de conhecimento (Dias, 2013). Se o ponto de partida consistiu em potenciar-se a premissa sociológica basilar do uso simbólico da arte (Zolberg, 1990), o processo e a respetiva ressignificação – assente na análise qualitativa das criações criativas realizadas: ilustrações/cartazes (Sontag, 1999) – constituem os pontos de chegada que motivam esta apresentação.

FEMALE GAZE. O CORPO MASCULINO ENQUANTO ESTRATÉGIA

Gabriela Massote Lima

A relação entre desejo e representação visual tem sido um dos temas da história da arte e da cultura visual das últimas décadas, das quais são inseparáveis hoje as questões de gênero. Historicamente a representação do corpo feminino refletiu nos papéis de gênero de forma negativa para as mulheres, ao mesmo tempo que protegeu o cânone masculino enquanto representante viril. Inscrever o olhar feminino ou o female gaze no cerne das nossas vidas seria uma possibilidade de reverter a mirada histórica ou mudar as relações patriarcais do olhar. Este artigo trata deste “olhar feminino” subjetivado, pensado sob dois eixos fundamentais: a crítica institucional e o desejo erótico. Incorporando, de forma contra hegemônica, o corpo masculino enquanto ferramenta de questionamento político.

AS FRAGILIDADES PERSISTENTES NO MUNDO DA ARTE DO JAZZ EM PORTUGAL

Bruno Baptista

Este artigo tem como objetivo revelar as principais fragilidades no mundo da arte do jazz em Portugal, ao analisar o alcance e os impactos efetivos das ações dos seus diversos agentes. Partindo da premissa de Becker (2008) de que um mundo da arte é constituído pela sinergia das ações dos seus agentes, analisamos os impactos destes, tanto positivos quanto negativos, na manutenção e transformação do mundo da arte. De seguida, veremos como os músicos mobilizam estratégias de ação do it yourself e do it together para contornar ou acrescentar aos significados criados por outros agentes e para garantir a manutenção do mundo da arte sempre que os restantes agentes artísticos não conseguem assegurar os seus papéis. Utilizamos dados recolhidos através de 45 entrevistas semidiretivas a músicos/as de jazz.

 

Registos de Pesquisa

O MUNDO COMO ATELIÊ, O DESENHO ENQUANTO MÉTODO: A ARTE-ETNOGRAFIA DE BRUNØVAES

Henrique Grimaldi Figueredo e Bru Novaes

Os fenômenos estéticos formam uma das partes mais substanciais da experiência social humana. Imagens, sejam elas quais forem, participam dos processos de significação e mediação das relações comunitárias. A arte, nesse sentido, não seria apenas um resíduo ou espelhamento dos processos sociais, mas um fenômeno dotado de poderes de confirmação, legitimação, reprodução e/ou contestação. Olhar para a arte (para os espaços onde é criada) e para seus métodos (os dispositivos e ferramentas que ativa), significa, ademais, olhar para a própria tessitura ou desconstrução das relações e narrativas sociais, sendo o artista, nesse ínterim, verdadeiro etnógrafo de seu tempo. Partindo desse pressuposto, este paper ilustra o potencial etnográfico na obra de brunøvaes, une artista que faz do mundo o seu ateliê e do desenho, um de seus métodos preferidos de investigação.

O DIREITO À CIDADE DO PORTO, UM DUALISMO INTEMPORAL. UM EXERCÍCIO ETNOGRÁFICO SOBRE A SITUAÇÃO DOS SEM-ABRIGO NA CIDADE DO PORTO

André Granja

A realidade do sem-abrigo nas ruas do Porto é cada vez mais grave. Atualmente encontramo-nos numa crise habitacional com o aumento da especulação imobiliária e inflação. O aumento do número de pessoas a viver na rua aumentou, não só por causa da pandemia Covid-19 que surgiu sem precedentes, mas com o agravamento destes dois fenómenos mencionados. Com recurso a um exercício etnográfico verificaram-se vários episódios do dia-a-dia deste fenómeno que o senso comum não reflete. Por outras palavras, abordam-se o sentido de comunidade, as inseguranças entre indivíduos, os sonhos, as revoltas, o racismo, o desespero, etc. Os relatos recolhidos e analisados permitiram constatar que a ação camarária portuense não está a ser eficiente no combate à pobreza e à resolução da situação de sem-abrigo no Porto.

 


VOL. 7 | N.º 1

Apresentação

Paula Guerra 

QUANDO A ARTE É PODER E VIDA. PRÓLOGO SOCIOLÓGICO

 

Artigos

THIS IS WHERE I DRAW THE LINE: CREATIVE INTERVENTIONS ON PUBLIC MONUMENTS IN THE EAST OF EUROPE AND THE GLOBAL SOUTH

Voica Pușcașiu
In recent times, there has been a rise in debates surrounding public monuments, with narratives becoming increasingly contested. While the act of damnatio memoriae is not new, this study will focus on how contemporary art is introducing a more imaginative form of protest when it comes to statues. It is interesting to note that despite the differences in geography, political destiny, and cultural aspects, countries in the former Eastern Bloc and the Global South share similar attitudes towards unwanted art in public spaces. This article will compare relevant examples from both regions and explore questions regarding the legality of such practices, as well as why contemporary public art often falls short. Ultimately, the goal is to try to identify what lies ahead for both existing and forthcoming public art.
 

MUITO MAIS QUE UM GRITO. HISTÓRIA E LITERATURA NO COMBATE AO AUTORITARISMO

Cláudia Fontineles

O texto visa discutir a relação existente entre História e Literatura no combate ao autoritarismo, seja no Brasil ou no mundo, pois a obra literária “Os que bebem como os cães”, de autoria do escritor piauiense Francisco de Assis Almeida Brasil, publicada em 1975, não precisa em qual tempo ou território geográfico a trama ocorre. Ainda assim, o livro aborda questões referentes às mordaças geradas pelo autoritarismo, suas práticas de repressão e de silenciamento, assim como as formas de resistência a essas práticas. Escrito em uma temporalidade psicológica, incorpora e aborda questões fundamentais pertinentes ao contexto histórico de
sua produção: o Brasil que vivia sob uma ditadura civil-militar. Analisamos como a obra literária discute temas como violência, humilhação, liberdades individuais e sua supressão, que ameaçam a vida democrática e a dignidade humana, além de abordar o significado dessas questões para a história brasileira no recorte temporal em que foi escrita e publicada. Com isso, pretendemos discutir como a produção literária pode contribuir para refletir acerca da democracia e do autoritarismo em diferentes momentos históricos, mais especificamente, no tempo de sua produção. Para tanto, a pesquisa recorre à análise da referida obra, bem como os estudos historiográficos sobre o período ditatorial no Brasil, para entender as interfaces entre História e Literatura no combate ao autoritarismo.
 

A ARTE ECOLÓGICA EM PORTUGAL: ARTE ATIVISMO E POLÍTICAS CULTURAIS SOB A PERSPECTIVA DOS ESTUDOS CULTURAIS

Tatiana Lopes Vargas

Abordagens críticas sobre sustentabilidade ambiental são necessárias para evitar a mera reprodução de discursos políticos e institucionais (Krieg-Planque, 2010), e a arte pode ser uma forte aliada neste sentido. Artistas podem ser agentes de transformação para a sustentabilidade ambiental (Dieleman, 2008) e a arte
ecológica pode ser uma prática de resistência que estimula a colaboração e a interdisciplinaridade. Tendo os Estudos Culturais como principal base epistemológica, este estudo visa refletir sobre o contexto geral em que se apresenta a relação entre arte e sustentabilidade ambiental, em Portugal, com vistas a pensar nas tensões implicadas neste contexto. Para além de uma discussão teórica sobre arte ativista e arte ecológica, propõe-se
uma reflexão sobre o contexto das políticas culturais portuguesas ligadas ao ambiente. Foi realizada uma análise teórico-interpretativa, com uma orientação crítica e reflexiva, com base nas informações disponibilizadas pela Direção Geral das Artes sobre o tema. Com este estudo, espera-se contribuir para a reflexão sobre a identidade política da arte e a necessidade do setor cultural questionar as suas práticas e os contextos sob os quais se desenvolve a produção artística ambientalmente sustentável em Portugal.
 

MULHERES PINTADAS, REPRESENTAÇÃO DE GÊNERO NAS PINTURAS DE TARSILA DO AMARAL

Bruna Tupiniquim Marques e Rafaela Santiago Lobo

Analisar representações sociais através de obras de arte exige sensibilidade artística e pragmatismo sociológico, para que não se reifique os objetos de pesquisa ou se caia em devaneios. Por isto, na pesquisa em questão buscamos compreender de que forma a representação da mulher foi realizada através das pinturas da artista por meio de base teórica e prática. Nos debruçamos sobre 20 obras de arte de Tarsila do Amaral com o intuito de interpretá-las e ao mesmo tempo nos conscientizarmos dos nossos limites enquanto pesquisadores. As pinturas, nos permitiram uma análise sócio artística acerca das representações de gênero nas composições plásticas realizadas por Tarsila. As diretrizes de análises norteadoras desta pesquisa são: objetivo geral - Investigar a representação de gênero nas pinturas de Tarsila do Amaral – De que forma é realizada representação de gênero nas pinturas de Tarsila do Amaral? - objetivos específicos – 1 De que forma a mulher negra é representada? - 2 De que forma a mulher indígena é representada? - 3 De que forma a mulher branca é representada.? - 4 Há representação da mulher através de forma não humana?
 

ALÉM DAS PASSAGENS: WALTER BENJAMIN, A MONTAGEM E AS IMAGENS NAS CIÊNCIAS SOCIAIS

Lucas Maroto Moreira

O artigo busca articular a obra Passagens, de Walter Benjamin, e o método empreendido pelo autor, denominado “montagem”, à formulação de um campo epistemológico voltado ao uso de imagens na Antropologia. Revisitando o livro Passagens, organizado em torno de fragmentos textuais e imagéticos coletados por Benjamin ao longo de 13 anos, o presente texto busca enfatizar o princípio de uma forma de pensar por imagens, inspirada na montagem literária e cinematográfica, que se encontra na obra benjaminiana. Por conseguinte, aborda a emergência do paradigma da montagem de imagens, estáticas ou em movimento, na produção do pensamento. Por fim, associa o trabalho do(a) antropólogo(a) visual ao bricoleur, apontando para um campo de conhecimento imagético interdisciplinar, em contraponto à lógica textual-verbal na qual tradicionalmente se pautam as Ciências Sociais.

ESTOU ALÉM DO HOMEM COM H. A SUBVERSÃO DO PATRIARCADO ATRAVÉS DA ARTE BRASILEIRA E PORTUGUESA NO FINAL DO SÉCULO XX

Juliana Queires e Yatan Alves

No contexto desse trabalho, temos como propósito examinar e melhor compreender duas emblemáticas figuras da música brasileira e portuguesa: Ney Matogrosso e António Variações. Ambos os artistas desempenharam papéis significativos na contracultura e resistência durante as décadas 1970 e 1980.
As performances artísticas de ambos os artistas que, por vezes, foram consideradas exuberantes e até mesmo "exageradas", representaram uma ruptura com a noção de masculinidade patriarcal predominante, tornandose uma fonte de inspiração e liberação para muitos outros artistas que os sucederam. O objetivo central deste estudo é apresentar as trajetórias artísticas desses artistas e, por meio de uma análise de caráter qualitativo, identificar as semelhanças e diferenças, destacando a relevância de Ney Matogrosso e António Variações como representantes da contracultura, do artivismo e da desconstrução de estereótipos de género em países marcados pelo conservadorismo e autoritarismo. No contexto brasileiro, Ney Matogrosso, com presença cênica única, visual exuberante e performances provocativas desafiaram os padrões estabelecidos, desconstruindo os estereótipos de masculinidade vigentes. António Variações, em Portugal, através de suas performances únicas e inovadoras, desafiou os padrões convencionais de masculinidade e promoveu uma abordagem artística disruptiva. Sua música e suas performances eram uma expressão genuína e original de sua interioridade, refletindo-se em seu modo de vestir, pintar e se apresentar no palco. Tanto Ney Matogrosso, quanto António Variações enfrentaram contextos políticos e sociais marcados pelo conservadorismo e pela repressão. Enquanto Ney viveu sob a ditadura empresarial-militar no Brasil, Variações testemunhou o fim do Estado Novo em Portugal e a redemocratização, pós 25 de Abril de 1974.

 

Registos de Pesquisa

DIRECTO E VERDADE O CINEMA

Jorge de Carvalho

O KINO-DOC, núcleo de cinema de cursos de documentário presenciais e online, apresentou mais um programa na Universidade do Porto. “Directo e Verdade o Cinema” reúne documentários que ajudam a perceber os conceitos gémeos Direct Cinema e CinéCinéma Véritéiados entre os anos 50 e 60 do século passado, quando a portabilidade audiovisual se impôs, e profetizados em filmes de épocas anteriores. Duas expressões éticas e filosóficas da relação do cinema com a realidade, em que esta se revela meramente pela observação (o cineasta como uma mosca na parede do cinema direto) ou, pelo contrário, essa revelação se cumpre pela intervenção de quem filma sobre o que filma (o cineasta como uma mosca na sopa do Vérité). Dois credos que se mantêm essenciais no entendimento do documentário contemporâneo.
 

EXPLORANDO O RITMO DA EXPRESSÃO. O DESENVOLVIMENTO COREOGRÁFICO DAS DANÇAS DE RUA

Inês Duarte

Na atmosfera das danças de rua, cada passo conta uma história única, e a expressão transcende as barreiras do convencional. Estes estilos de expressão artística proveem de uma cultura relevante na história das artes e uma história que transporta significado político e de luta pela liberdade de expressão. Desde o início da minha pesquisa e carreira, tenho estudado incessantemente a história e cultura dos estilos de dança de rua e aprofundando a conexão dos mesmos com as possibilidades criativas que nos trazem. Como bailarina profissional, tenho dedicado a minha carreira ao aprofundamento da linguagem do movimento, mergulhando nas técnicas de estilos como popping, hip-hop, locking, waacking, house, entre outros. Este registo é uma jornada pelo meu
desenvolvimento coreográfico, destacando como a musicalidade, texturas, qualidades de movimento, intensidade e respiração convergem para criar uma expressão autêntica dentro desses estilos dinâmicos e ecléticos.
 

 


VOL. 6 | N.º 3

Apresentação

Paula Guerra 

AS ARTES, AS EXPERIÊNCIAS E OS MUNDOS DA VIDA

 

Artigos

“SAMBA DE UMA NOTA SÓ”? TURISMO CULTURAL NUM DESTINO DE SOL E PRAIA

Ana Rita Cruz

Destinos turísticos de “sol e praia” são, normalmente, caracterizados por uma base económica pouco diversificada. Mas a própria actividade turística é quase sempre excessivamente concentrada na oferta do produto primário. Por outro lado, a cultura é reconhecida como uma dimensão estruturante da experiência turística, constituindo uma das principais motivações de viajem a nível mundial e gerando benefícios mútuos na oferta e na procura. Este artigo explora estas ideias e procura perceber se o turismo cultural tem espaço para crescer e para se consolidar num contexto territorial, como o Algarve, que concentra a sua atividade turística no produto ‘sol e praia’. A análise de segmentação do perfil dos visitantes foi elaborada a partir de um questionário aos turistas da região e os resultados permitem lançar algumas reflexões sobre o papel do turismo cultural num destino turístico que se pretende mais diversificado e sustentável.

 

GRAFFITI, MIGRACÃO E DECOLONIALIDADE: REFLEXÕES SOBRE A “PRETOGALIDADE DE SER”

Maria da Graça Luderitz Hoefel, Denise Osório e Paula Guerra

Este artigo procura analisar o graffiti intitulado Pretogalidade de ser (2022), de autoria da artista Moami, a partir de sua experiência artística e de vida, a fim de refletir sobre as relações entre o graffiti, a migração e a colonialidade no contexto português. Trata-se uma pesquisa qualitativa, com método misto, composto por pesquisa-ação, netnografia e história oral. A obra Pretogalidade de ser (e a trajetória da artista) parece revelar as ambivalências do mundo globalizado e seu próprio modo de existência, que reconhece a perpetuação das colonialidades, mas simultaneamente também afirma sua pertença ao país colonizador e aos valores da modernidade. Assim, a reflexão sobre a obra de Moami sinaliza muitas aproximações com a complexidade da contemporaneidade, caracterizada pelos fluxos, pela transitoriedade e inconstância.

 

LIBERTE O CINEASTA QUE EXISTE EM VOCÊ! O PROTAGONISMO DOS ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO FESTIVAL DE FILMES DE CURTA-METRAGEM DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE BRASÍLIA
Maria do Carmo G. A. Alvarenga

O presente artigo oferece uma reflexão sobre o Festival de Filmes de Curta-metragem das Escolas Públicas de Brasília criado em 2015 e realizado como parte da programação do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. A partir do exemplo de experiências e abordagens teóricas sobre a criação audiovisual nas escolas, além de depoimentos dos participantes, pretende-se analisar os impactos do uso do cinema como fonte de conhecimento e percepção, elevando a ação pedagógica de assistir a um filme como mera forma de ilustração para uma imersão na produção fílmica, que culmina na realização de um festival. O artigo aborda, com base nos estudos sobre festivais, os efeitos para a cultura e a educação, ao ampliar o leque das atividades de formação já existentes nos festivais de cinema profissionais e ao contribuir para acrescentar o segmento estudantil às categorias de festivais especializados.

 

A FORMAÇÃO DE ESPECTADORES TEATRAIS NO AMBIENTE DIGITAL NUM CENÁRIO PANDÊMICO

Robson Rosseto e Sara Dobginski de Moraes

A formação de espectadores é analisada neste artigo com o foco voltado ao teatro digital, dentro do ambiente pandêmico em que o Brasil esteve imerso nos últimos anos. Para tal, foram trazidos alguns dados indicativos sobre os hábitos culturais e acesso a redes de internet de brasileiros. Conclui-se que as desigualdades sociais de acesso à cultura no território nacional se mantêm desiguais no acesso à internet.

 

ENTRE ESCRITAS E CRÍTICAS: INTELECTUALIDADE E HISTÓRIA DA LITERATURA NA OBRA DE O. G. REGO DE CARVALHO

Pedro Pio Fontineles

O estudo compreende a (re)construção da história da literatura piauiense, a partir da atuação intelectual de Orlando Geraldo de Carvalho (1930-2013), problematizando questões de fronteiras e de identidades do “ser piauiense”. Debate as interrelações entre o local, o regional e o nacional como demarcadores de cânones literários e que geraram ranhuras com outros intelectuais, especialmente no âmbito local. Metodologicamente, o estudo fez a leitura analítico-interpretativa dos documentos, compostos pelo livro Como e por que me fiz escritor (1994), de seus romances, além de antologias e fortuna crítica sobre a obra do literato. Como arcabouço teórico-metodológico, foram utilizadas proposições para pensar o “campo literário” e dimensões canônicas e identitárias, a biografia e a autobiografia. O estudo considerou, em linhas gerais, que a atuação e obra do literato são fulcrais para (re)pensar os debates sobre a história da literatura piauiense e da crítica literária, por meio dos elementos dinâmicos da escrita (auto)biográfica.
 

A VIDA ATRAVÉS DE SANGUE, DE VÍSCERAS E DE SUSTOS: O MEDO E A FORMA COMO O CINEMA DE TERROR REFLETE O SOCIAL

Daniela Covarrubias

O presente artigo tem como objetivo compreender a construção do medo no gênero cinematográfico do terror, entendendo que os sentimentos provocados por este gênero são influenciados pelo contexto histórico-social. Compreendendo que o sentimento de medo é bastante complexo, a pergunta de partida “O que provoca o medo?” nos revela a complexidade do ser humano, dos sentimentos, dos sujeitos e como estes estão profundamente relacionados com um contexto mais amplo, influenciado pela cultura, pelo social e pelo político. Através de uma extensa investigação bibliográfica e filmográfica, busca-se compreender a relação telespectador-obra e as ferramentas utilizadas para provocar sentimentos de angústia, aflição e medo. Investiga-se diversas formas de provocar o medo e como este está relacionado com questões individuais e coletivas simultaneamente, e, com questões da realidade objetiva e da subjetividade do ser humano. Estas dicotomias tornam o medo um sentimento multidimensional.

Registos de Pesquisa

HISTÓRIA ORAL E ENTREVISTAS NO ESTUDO DAS ARTES – ANÁLISE DE APLICAÇÃO AO ESTUDO DE JORGE LIMA BARRETO

André Quaresma

Existe uma natureza híbrida que envolve a produção artística do objeto de estudo Jorge Lima Barreto e dos seus processos composicionais, intrincados noutras formas de manifestação artística; e uma contemporaneidade dos intervenientes nos acontecimentos investigados, ficando clara a necessidade do recurso a metodologias de história oral como a entrevista. Partindo do capítulo Oral History Interviews in Contemporary Art: Artistic and Scientific Methods de Sibylle Omlin, da publicação Práticas de Arquivo em Artes Performativas, pretende-se analisar a aplicação e disponibilização das entrevistas, que serão feitas para tornar a produção decorrente da investigação, esteticamente coerente com a multidisciplinaridade da temática estudada. Para assim atingir um produto final com preocupações não só cientificas, mas também estéticas e conceptuais.

 

Recensões/Resenhas

RECENSÃO CRÍTICA DO LIVRO “RUA DE MÃO ÚNICA: INFÂNCIA BERLINENSE - 1900” DE WALTER BENJAMIN (2013)

Sidarta Landarini

A respectiva recensão busca interpretar o livro “Rua de mão única: Infância berlinense - 1900” de Walter Benjamin como uma literal rua surrealista. Dessa maneira, é proposta uma caminhada, através de pequenos comentários, fragmentos e livres associações que os aforismos benjaminianos reverberam para o autor da recensão. Realizar tal exercício é levar a premissa máxima de que a leitura de um livro é uma experiência (erfahrung) passível de ser compartilhada, não encerrada em si, e sim em relação com outros leitores e com as palavras do autor original.

 

 


TODAS AS ARTES || TODAS AS FESTAS || TODAS AS UTOPIAS ||2024

TODAS AS ARTES ||  TODAS AS FESTAS || TODAS AS UTOPIAS ||2024

A equipa Todas as Artes deseja um Feliz Natal e um Bom Ano Novo.
(c) Esgar Acelerado

FEMINISM IN THE FRAME OF THE NEOLIBERAL REGIME:

FEMINISM IN THE FRAME OF THE NEOLIBERAL REGIME:

Women, Welfare and the Current Crisis

Conferência com Angela McRobbie, Goldsmiths College, University of London

8 de Novembro, 18h

Sala de Reuniões 1 da FLUP

Chair e Apresentação: Paula Guerra (IS-UP/FLUP)

Comentário final: Renata Gaspar (IS-UP/ESMAE)

Angela McRobbie é professora emérita da Goldsmith College, da Universidade de Londres. É membro da Academia Britânica e recebeu o prémio Honorary Doctorate da Universidade de Glasgow. As suas áreas de investigação centram-se na economia criativa e na indústria da moda com referência ao setor independente de pequena escala. Escritora feminista, é autora de muitos livros e artigos académicos sobre diversas temáticas tais como género e sexualidade, indústria da moda, feminismo e a ascensão do neoliberalismo.

https://www.gold.ac.uk/media-communications/staff/mcrobbie/


VOL. 6 | N.º 2

Apresentação

Paula Guerra e Lígia Dabul

ENVOLVIMENTO SOCIAL OU UMA APOLOGIA AO POTENCIAL TRANSFORMADOR DA ARTE

 

Artigos

COVID-19 AND PUBLIC POLICIES FOR CULTURE AND THE ARTS AN INSIGHT FROM THE GLOBAL SOUTH 

Maria Alcinete Gomes de Menezes, Gerciane Maria da Costa, Kyara Maria de Almeida Vieira e Luíza Raphaela Xavier

This work consists of research of the cultural public policies in the Brazilian northeast during the Covid-19 pandemic, with a special focus on the municipality of Mossoró, Rio Grande do Norte between March 2020 and march 2022. The main objective of this study is to identify the actions of the public power via public tenders, and to analyze their strategies to support the population of Rio Grande do Norte that produces culture and art as a form of living. The methodology is based on qualitative approaches such as bibliographic research, secondary data collection and mapping of public tenders on government platforms and social networks. The emergence of this research is oriented towards the importance of the public power in offering answers to culture producers who had their activities interrupted because of the Coronavirus. The results indicate that the State’s emergency measures made possible the maintenance of the actions of culture and art, being the Lei Aldir Branco [Aldir Blanc Law] an important achievement of the cultural sector.

 

CRUZANDO PAISAGENS CRIATIVAS E PRÁTICAS INCLUSIVAS NO PROGRAMA BAIRROS SAUDÁVEIS

Ana Sofia Baptista

Transgredir fronteiras, na interseção do trígono criatividade, artes, cultura, com a inclusão social, pode significar a adoção de um posicionamento ativo e criativo na sensibilização para os grupos vulneráveis da sociedade. Esta proposta assenta em perceber o papel da criatividade na cultura e nas artes enquanto ferramentas de intervenção-ação em prol de práticas e dinâmicas de inclusão social. Na práxis inclusiva, a cultura e as artes têm-se revelado fundamentais para a construção de programas intersetoriais, encontrando validação na integração de cidadãos e grupos excluídos, ou socialmente desfavorecidos. Partindo do cruzamento de diversas manifestações culturais e artísticas, em intervenções que cruzam diferentes geografias e contextos do território nacional, robora-se o impacto na inclusão social. A incidência num recorte de estudo, Programa Bairros Saudáveis, desvela o valor dessas manifestações, ao nível do investimento nas competências e habilidades, ao nível das vantagens face à sensibilização para a mudança social e no âmbito da reconstrução de identidades sócio espaciais coesas. A aproximação à análise de projetos de intervenção social, através de uma abordagem qualitativa e exploratória, sustentada na arts-based research, resulta no reforço na criatividade, na cultura e nas artes como evidência uníssona enquanto recurso transcendental para a evolução do Homem. Na sua diversidade os projetos congregam artefactos que ficarão na comunidade, as ações reproduzem-se como memória simbólica expressa nas práticas artísticas comunitárias e participativas, encaradas como estímulos para outras práticas inclusivas.
IMIGRAÇÕES, GASTRONOMIAS E IDENTIDADES: AS CENAS CULTURAIS DE SÃO PAULO

Camila Alonso Milani

O tema deste artigo propõe estudar como a gastronomia reflete os fluxos imigratórios que construíram a cidade de São Paulo e é capaz de traduzir a identidade cultural e cosmopolita da maior metrópole do Brasil. Entre comunidades e bairros italianos, japoneses, árabes, entre outros, a capital paulista encontrou na gastronomia, não só um modo de comunicação cultural entre tantos povos, mas a representação da sua identidade e do seu estilo de vida. Através de uma investigação qualitativa, de caráter etnográfico e exploratório, buscamos analisar, discutir e compreender, através do “comer”, as trajetórias e dinâmicas destes imigrantes em São Paulo, de modo a instaurar diferentes cenas culturais e gastronômicas na cidade.

 

ESTÉTICA E POLÍTICA NO MOVIMENTO PUNK EM ARACAJU, BRASIL

Letícia Oliveira Feijão Galvão e Frank Nilton Marcon

Este artigo tem como intuito discorrer sobre como a cena punk pode ser percebida enquanto um movimento que busca estabelecer linguagens de ação política através dos seus modos de fazer e de sua expressão estética. Considerando que a arte pode ser interpretada como um recurso de ativismo político, buscamos analisar como se desdobram as relações entre estética e política no âmbito da cena punk em Aracaju, capital do estado de Sergipe, no Nordeste brasileiro, bem como refletir sobre como o punk se estrutura enquanto um movimento simultaneamente político e identitário, como afirmam as análises de Guerra (2014, 2017, 2019, 2021) e outros autores. Os métodos utilizados foram a observação direta de eventos produzidos pela cena e a realização de entrevistas semiestruturadas com sujeitos associados ao punk na cidade. Dessa forma, a partir dos conceitos mencionados acima, buscamos analisar as novas conexões entre estética e política que se estabelecem na contemporaneidade global e as particularidades de suas reapropriações locais.

 

NEIVA OU OS PRIMÓRDIOS DO DO-IT-YOURSELF NO SUL GLOBAL

Yatan Alves

Este artigo tem por objetivo apresentar a figura de Neiva Chaves Zelaya, brasileira, fundadora do movimento espiritualista intitulado Vale do Amanhecer. Nossa proposta é lançar um olhar a partir de uma outra perspectiva, distanciando-se da sociologia das religiões e indo de encontro à sociologia da cultura, no que diz respeito às manifestações estéticas de Neiva no seu Vale do Amanhecer. O cruzamento entre espiritualidade e estilo prenuncia um paradoxo p Propedêutico face às materialidades espirituais impregnadas no modo de se apresentar de Neiva e seu impacto na comunidade espiritualista criada por ela própria.

 

CONTRIBUTOS PARA UMA GENEALOGIA DO CAMPO DA MODA EM PORTUGAL (1960-2020)

Paula Barros

Em Portugal, a moda é um campo quase invisível nas ciências sociais e, particularmente, na sociologia. Com efeito, existe ainda uma tendência generalista – e redutora – para pensar a moda como algo supérfluo, sem se ter em linha de conta que a mesma afeta outros campos da vida social. Neste artigo, propomo-nos fazer uma reconstituição socio-histórica do campo da moda em Portugal, no período entre 1960 e 2020 - numa abordagem que integra o ponto de visto dos atores, mas também as problemáticas que atravessam e definem este campo -, partindo da análise de fontes secundárias.


VOL. 6 | N.º 1

Apresentação

Paula Guerra e Lígia Dabul

ARQUIVOS, ESCALAS, MÉTODOS E SABERES EM CIÊNCIAS SOCIAIS

 

Artigos

SIMPLY LONGING FOR WILDERNESS. FICTIONS OF NATURE PRESERVATION IN WESTERN POP MUSIC

Thorsten Philipp

The individual and social longing for an intact and untouched nature is a core element of environmental crisis dynamics. To what extent is the reinvention of an authentic nature and of compatible lifestyles a theme of pop music? Can cultural production promote lacking communicative capacity to moderate environmental conflicts and sustainable living? This article reflects the societal dimension of pop music to examine its communicative potentials in processing the problem of environmental degradation and nature preservation. It is particularly the Western trope of wilderness, the idea of an unaltered, virgin nature, that deserves interest. With its origins in the 19th century land ethic, it still today offers an entry to renegotiate fictions, norms, dreams and futures of nature in times of major environmental destruction and apocalyptic disasters. The selected songs show recent attempts to reconcile wilderness and modern life, staging the colonialist narration of the Noble Savage – the Indian as a wise steward of nature. These and similar ideas of wilderness, indigenous knowledge and compatible lifestyles address the core postulate of sustainability for global and intergenerational justice. The analysis of textual and sound regimes not only offers a hybrid mirror of political communication on sustainable development through politainment; it additionally permits to discover latent structures of social systems by unveiling conflict dynamics which are mostly ignored in the public discourse.

A MÚSICA ELETRÓNICA AMBIENTAL: DA PROFUNDIDADE SONORA AOS IMAGINÁRIOS DA MENTE II

Frederico Dinis

Este artigo parte da definição para a música eletrónica ambiental, enquanto elemento indutor para a criação de um espaço para pensar, e apresenta um conjunto de autores e de trabalhos sonoros orientados para uma preocupação com o espaço. Estes autores são enquadrados desde as fundações da música eletrónica contemporânea, de meados do séc. XX e que têm por base trabalhos que revolucionaram a forma como a música eletrónica passou a ser vista, até à nova expansão da música eletrónica ambiental, com a aparição de novas sonoridades e de novos caminhos para este género musical a partir dos anos 2000, consolidando-o e estabilizando-o enquanto género musical. Mas a música eletrónica ambiental como género deve ser vista como uma sobreposição de informações, e não apenas como uma interação com um ambiente. Assim, defendemos que a ligação social da música eletrónica ambiental ao próprio ambiente e envolvente mudou ao longo da sua evolução enquanto género, tal como mudou essa envolvente, reforçando que o lugar hoje é um espaço pessoal, tal como a experiência de escuta associada à música eletrónica ambiental. A experienciação
atual da música eletrónica ambiental na conceção, ampliação ou descontinuidade de lugares, expressa por si só o desejo de exercer um agenciamento interno ou uma mediação com a própria envolvente, operando como uma reflexão do ‘eu’, recorrendo a sonoridades que movem a mente. Um ‘eu’ que inclui o mundo social em que se está imerso e uma representação de lugares figurativos.
 

SOBRE A IDEIA DA CONSCIÊNCIA IMPRESSA NO EMBODIMENT DO SOM. MAX RICHTER, GUSTAV MAHLER E ALFRED SCHNITTKE

Maria-Roxana Bischin

Este artigo releva a ideia de consciência impressa, baseada em pesquisas básicas no campo da fenomenologia.A premissa é que a música é uma substância criada a partir da infinita corporeidade sonora. Daí deriva a perspetiva de que a corporificação é algo que está impresso por detrás dos nossos julgamentos analíticos e percetivos. O embodiment deve ser visto como uma dinâmica com dois princípios: (a) o da criação da substância para-aconsciência e (b) a transferência da substância da percepção para o processo da temporalidade.
 

PERSPETIVAS SOBRE A MÚSICA CLÁSSICA BRASILEIRA E A INFLUÊNCIA DA INDÚSTRIA CULTURAL

Miqueias Felipe Costa Feitosa e André Dallálio

Este artigo aborda as implicações da Indústria cultural nas produções e divulgação da música clássica brasileira. Foi realizado entrevistas semiestruturadas com compositores e integrantes do universo da música clássica no Brasil. O objetivo desta pesquisa é compreender os impactos da Indústria Fonográfica a divulgaçãono Brasile explicações sociológicas a respeito. Entrelaçando as teorias sociológicas com as entrevistas realizadas, foi compreendido que a indústria cultural causa impactos negativos e positivos. No entanto, existem outros fatores sociais que interferem, como a educação.
 

POLÍTICAS DE MEMÓRIA EM IFIGÉNIA DE TIAGO RODRIGUES, POR ANNE THÉRON

Ana Cunha

O Teatro Nacional de São João do Porto recebeu, no início de 2023, o Festival Internacional de Espetáculos Finisterra, que abriu com Iphigénie, de Tiago Rodrigues, encenado por Anne Théron do Théâtre National de Strasbourg. A peça, que parte do original de Eurípides, repensa os aspetos clássico do teatro grego e oferece-nos uma profunda consideração sobre a importância da memória para as comunidades, o conflito entre memória coletiva e individual, a responsabilidade dos membros mais vulneráveis da sociedade em não permitir que o Poder apague/esqueça as barbáries cometidas e o determinismo social. Propomo-nos, nesse sentido, a fazer uma análise literária e sociológica da relevância da programação desta peça no cenário europeu atual.

 

RAP E MÚSICA DE INTERVENÇÃO: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO RAP EM PORTUGAL

Miguel Vidal

Este artigo procura abordar o rap português na sua dimensão mais interventiva. Desenvolve-se assim a busca pela compreensão de como esta dimensão tão inerente ao desenvolvimento  do rap no contexto norte americano é aplicada e entendida, tendo em conta as especificidades do contexto português. Partindo da análise documental de artigos de dois dos jornais de referência portugueses, desenvolve-se a imagem da forma como os públicos interagem com a dimensão interventiva do rap e a forma como a interpretam. Procurando sempre compreender-se se esta parece ser influenciada principalmente pela própria história interventiva e reivindicativa do rap (e é vista como tal), ou se parece seguir o legado da “tradicional” música de intervenção portuguesa do pós 25 de abril.

 

Registos de PesquisaPARA ALÉM DO ESPACIAL: AS POTENCIALIDADES ARTÍSTICAS DA RELAÇÃO ENTRE A FRONTEIRA E A MEMÓRIA

André Araújo

Sob uma perspetiva multidisciplinar, os estudos da fronteira têm pensado o território para lá do espacial, integrando práticas artísticas que exploram o abstrato e o simbólico. Contudo, as principais tendências da border-arttêm vindo a refletir a propensão para intervenções performativas do território que desconsideram as possibilidades da exploração das dimensões temporais, focando-se sobretudo na reconfiguração do tangível. O presente texto propõe, através do acompanhamento das opções metodológicas para a criação de dois trabalhos artísticos do autor, enquadrados numa análise crítica dos principais artistas da border-art, refletir acerca das possibilidades estéticas que estão presentes no território fronteiriço quando encarado a partir das ramificações da memória e das temporalidades.
 

Recensões/Resenhas

A MÚSICA DE JOHN CAGE – JAMES PRITCHETT

André Quaresma