Apresentação

Paula Guerra

Manuel Castells (2009) diz há já muito tempo que vivemos na era da Internet. Esta permeia todas as esferas sociais. Veja-se no aspeto político: foi a Internet que trouxe o acentuar das práticas participativas, como é o caso dos orçamentos participativos ou o crowdfunding. No fundo, uma política participativa, horizontal e sem intermediários. Um modelo particularmente fecundo para uma época de desencanto com a democracia participativa, tida como hierárquica e demasiada afastada dos cidadãos. A arte não é exceção e tem sofrido enormes influências com o avanço da Internet.  A  atual  importância  de  fenómenos  como  o do-it-yourself, o maker movement e o cooperativismo na Internet não podem ser entendidos sem se levar em consideração o digital shift que levou a cultura para um novo modelo, que alguns apelidam de Cultura 3.0 (Sacco, Ferilli & Blessi, 2018; Guerra, 2019).

 

Artigos

Ranking contemporary art galleries: a sociological attempt from french case
Alain Quemin

ABSTRACT: Contemporary art galleries remain little known partly because the very definition of contemporary art makes it difficult to delimit their population. In order to bring more light on contemporary art galleries in France, we decided not only to try and define their population, but also to rank them. For this and in order to objectivize the various positions, we gathered information on all art galleries concerning: (i) such factors as their locations, participation to art fairs and recognition by public institutions, but (ii) also considering their rosters. The analysis shows a general link between the two. It also unveils a strong hierarchy between contemporary art galleries in France with a very significant presence of galleries of foreign origin in the first ranks, as a direct consequence of the high degree of internationalization of the art market.

Keywords: gallery, contemporary art, ranking,reputation, art market

 

Modernismos alternativos: Joan Brossa e o conceito de “participação semântica” de Hélio Oiticica
Fernando Gerheim

RESUMO: A ação e o trânsito entre linguagens são pensados de modo diferente da narrativa hegemônica da história da arte ocidental a partir da obra de Brossa, em especial as Suítes de Poesia Visual (1959 -1969),e do conceito de “participação semântica” de Hélio Oiticica, em especial na obra Tropicália (1967). São analisados os modos únicos como a palavra e a imagem se relacionam na obra de Brossa focalizada no contexto da arte brasileira no mesmo período. Esses contextos de modernismo alternativo apontam para uma situação particular em que a transgressão é ao mesmo tempo a tradição. O artigo persegue os modos diferentes, que obrigam a uma mudança no eixo da narrativa hegemônica, da relação entre palavra e imagem nas manifestações analisadas.

Palavras-chave: modernismo alternativo, palavra e imagem, Joan Brossa, “participação semântica”, Hélio Oiticica

 

Celebridades, narcisismos e iconofilias na pós-modernidade
Roney Gusmão

RESUMO: Para construção deste texto, utilizamos o trailer do documentário “Truth or Dare” com intuito de problematizar algumas contradições ou dilemas epistemológicos na carreira da Madonna, considerando a sua incorporação e performance da praxis e ethos pós-moderno. Madonna recorreu à saturação de apelos mediáticos e ao uso das redes sociais, criando uma persona e espetacularizando sua vida ao serviço da fama, fato que a tornou um interessante arquétipo do tempo histórico em que vivemos. Interessa-nos,  portanto, compreendê-la como expressão dos valores que impregnam a cultura pós-moderna. Simultaneamente, discutimos e problematizamos a importância das celebridades na construção dos imaginários culturais pós-modernos.

Palavras-chave: Madonna, pós-modernidade, narcisismo, celebridade

 

Guia de referência da música Skinhead White Power brasileira
Alexandre de Almeida

RESUMO: Este artigo relata a experiência da produção de um guia de referência da música skinhead white power brasileira. Utilizando uma abordagem interdisciplinar, sua finalidade é mapear organizações grupusculares, bandas e seus repertórios, esses últimos entendidos como ferramentas de agitação metapolítica. O guia de referência é um instrumento de apoio à pesquisa, analítico e exaustivo, cuja finalidade é agrupar em uma mesma obra informações a respeito de um determinado conjunto de documentos de uma determinada cena musical. O guia sobre a cena skinhead  white  power brasileira foi organizado na forma  de verbetes, mapeando toda a produção musical das bandas  com  este  perfil, identificando  bandas, álbuns, canções (e suas respectivas funções) e a trajetória das organizações grupusculares às quais estavam vinculadas.

Palavras-chave: neonazismo, arquivística, documentos sonoros, metapolítica, musicologia

 

Um jardim punk no bairro de alvalade: de símbolo do estado novo a ícone do Punk Rock português
Luiz Alberto Moura

RESUMO: Este  artigo  propõe  lançar  um  olhar  sobre  o  bairro  lisboeta  de  Alvalade  como  um  dos  pontos  mais emblemáticos do despoletar do punk rock português por volta do fim dos anos 1970. Procuramos identificar de que modo um novo conceito urbano aplicado e o cotidiano do local ajudaram a fomentar e a disseminar o estilo musical que tomou de assalto o imaginário juvenil português vindo diretamente do Reino Unido. Pretendemos visualizar também as condições urbanas e as contradições de Alvalade, bairro idealizado pelo Estado Novo, ou seja, criado pelo regime ditatorial de Salazar, que tornar-se-á ao longo dos anos e, contrariamente ao desejo do sistema, um centro de ideias e de contestação. Inicialmente propagado em Portugal pelo radialista António Sérgio, o punk rock se  espalhou  rapidamente  pelas  ruas  de  Alvalade  através  das  mãos  de  jovens  oriundos  de  famílias  de  bons rendimentos que lá se instalaram a partir dos anos 1960. Destacam-se as histórias de João Ribas, mítico vocalista de três das bandas mais importantes do estilo no país (Kú de Judas, Censurados e Tara Perdida, todas nascidas em Alvalade), do Jardim de Alvalade e do Café Vá-Vá, ponto de encontro da nova intelectualidade lusa na década de 1960,  que  se  torna  anos  mais  tarde  o  epicentro  e  ponto  de  referência  para  jovens  sedentos  por  cultura,  de informação e de rebeldia.

Palavras-chave: punk, cidades, juventude, espaço urbano, rebeldia

 

A critica de arte de Frederico Morais ao uso de novos mídia nos anos 1960 e 1970
Thamara Venancio de Almeida, Renata Cristina de Oliveira Maia Zago

RESUMO: Utilizando textos críticos fundamentais para a arte contemporânea, este artigo pretende abordar a visão do crítico de arte Frederico Morais em relação à utilização dos novos média por artistas contemporâneos. Segundo o crítico, o artista é uma espécie de guerrilheiro, e ao invés de construir/criar obras, ele deve propor situações. Nesse contexto, de proposições artísticas efervescentes e de intensa fusão com a vida cotidiana, os materiais se tornam cada vez mais precários, e com isso toda ideia de obra entra em crise. Pretendemos abordar esse contexto, anos  1960  e 1970,  ligado à crítica  profícua  de  Frederico  Morais,  de  forma  a  apresentar  seu  pensamento  e preferências sobre arte, assim como os motivos intrínsecos ao seu questionamento quanto à utilização de novas tecnologias, como o computador e o vídeo, por artistas latino-americanos.

Palavras-chave: crítica de arte, Frederico Morais, arte contemporânea, novos média, Anos 1960 e 1970

 

Registos de Pesquisa

Narrativas da Nova Gaia – 4400. Prospetos de hip hop na Comunidade jovem
Lídia Pinheiro

RESUMO: Dentro de uma leitura sociológica, o hip hop apresenta uma crescente importância no estudo das dinâmicas culturais contemporâneas nas últimas três décadas, uma vez que é entendido como um vetor de comunicação, identificação, reunião e reinvindicação dos jovens um pouco por todo o mundo. Desta feita, procuramos compreender o papel que o hip hop desempenha na construção identitária dos jovens inseridos no movimento, especificamente na vertente do rap, nas freguesias de Vila Nova de Gaia. Como surgiu o interesse para a integração no movimento? Quais os principais motivos e influências para a contínua presença? Qual a importância que o rap apresenta na vida de cada um dos jovens? Existe uma ligação entre o hip hop e a cidade eleita? Quais as principais mudanças entre a Velha e a Nova Escola? E qual o futuro que os jovens ambicionam? Estas são algumas das questões que nos propomos responder com base nas entrevistas – em forma história de vida – que realizamos a jovens rappers de Vila Nova de Gaia.

Palavras-chave: (sub)culturas juvenis, identidades, territórios, cenas musicais, hip hop

 

Recensões/Resenhas

Uma resenha do livro Keep It Simple Make It Fast: an approach to underground music scenes (vol. 4)
Jonas Pilz

Os 55 artigos de Keep it simple make it fast: An approach to underground music scenes (Vol. 4), locados em 11 secções, representam a pluralidade de apresentações, conversas,  propostas, produções, criações e intervenções do congresso KISMIF em 2018. Ainda assim, a delimitação do próprio evento, Gender, differences, identities and DIY cultures, é uma tônica que perpassa e enlaça as ramificações presentes no material. Organizado desde 2014, o KISMIF caracteriza-se pela reunião de debates e performances em torno do underground, das subculturas, da arte, da intervenção urbana — a ponto de o evento tomar a cidade do Porto para além das paredes onde é realizado — e da cultura DIY. São justamente estas manifestações de resistência, de atividade e de ativismo em torno do  reacionário e dos sistemas de opressão os principais pontos de análise distribuídos ao longo da leitura.