Apresentação

Paula Guerra e Lígia Dabul

A música e o music-making são, desde logo, temáticas que se destacam neste Número 2 do Volume 4 da nossa revista. Assim, parece-nos lógico que o foco desta introdução fosse a/na música. 

 

Artigos

Repensar a cultura DIY num contexto pós-industrial e global
Andy Bennett, Paula Guerra e Ana Sofia Oliveira

A partir de meados da década de 1970, a noção de cultura do-it-yourself (DIY) evoluiu de um ethos de resistência à indústria da música mainstream, centrado no punk, para uma estética mais amplamente endossada que sustenta uma vasta esfera de produção cultural alternativa. Embora não evitando preocupações contra-hegemónicas, esta transformação do DIY no que razoavelmente se poderia chamar uma “cultura alternativa” global também o viu evoluir para um nível de profissionalismo que visa assegurar a sustentabilidade cultural e, sempre que possível, económica.  Este artigo examina a longevidade da estética cultural DIY e a sua evolução num contexto global, considerando como esse crescimento exponencial nas práticas DIY coloca novas questões sobre a natureza e prevalência da estética DIY, interrogando se é necessário reposicioná-la como um aspeto cada vez mais central da vida urbana contemporânea.

Arquétipos da pós-modernidade: Celebridades e capitalismo contemporâneo
Roney Gusmão

Interessa-nos entender o modo como celebridades contemporâneas expressam o tempo histórico ao qual chamamos de pós-moderno. Para proceder esta abordagem, utilizamos a cantora Madonna como arquétipo, para enfatizar como características da pós-modernidade são condensadas e expressas em sua carreira. Este texto é produto de pesquisas que desenvolvemos com intuito de salientar a difusão de ideologias pela imagem mítica das celebridades, ancorando-as dialeticamente ao contexto histórico recente.

António Variações: retrato do cantor enquanto jovem inserido na sua geração artística e nas respetivas problemáticas identitário-culturais
Luís Carlos S. Branco

Existe, de há uns anos a esta parte, um intenso revival, em vários setores, em torno de uma das luminárias da História do Pop-Rock Português; refiro-me a António Variações. Contudo, a esse renovado e merecido interesse nem sempre corresponde um conhecimento mais profundo da sua arte e do seu pensamento. Por vezes, o discurso em torno dele pauta-se por equívocos, mitos e por uma perspetiva, aqui e ali, anacrónica. No meu entender, este performer deve ser estudado, e entendido, inserido no quadro maior das problemáticas socioculturais com as quais se debatia a sua geração artística e que eram também, em grande medida, as dele. Como é evidente, as questões identitárias que então se colocavam não são as mesmas que se colocam hoje. Além disso, pouco se sabe sobre o seu percurso, enquanto jovem artista, antes de editar as suas canções. É sobre estes tópicos, e outros correlatos, que me debruçarei neste artigo.

A ‘coletivização’ das instituições de arte contemporânea
Ana Carolina Freire Accorsi Miranda

Este artigo realiza uma análise sociológica do processo de aproximação da arte contemporânea brasileira com iniciativas colaborativas. Para isso, parte-se dos estudos de caso das curadorias de duas instituições de arte localizadas na cidade do Rio de Janeiro: Museu de Arte do Rio e Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica. O período delimitado para a coleta do material foi de 2013 a 2019. Buscou-se a partir dos seus discursos curatoriais entender as particularidades que ocasionaram no que é defendido em hipótese como a ‘coletivização das instituições’, processo que parece estar engendrado à institucionalização dos coletivos de artistas. Debruça-se sobre a trajetória de negociações e disputas ocorridas nos dois aparelhos culturais para que se tornassem ambientes frutíferos para o desenvolvimento de práticas que contribuíram para a problematização da autoria artística individual. E também, para a disseminação de um discurso não-hierárquico e mais colaborativo no mundo da arte contemporânea.

Adolescentes e jovens indígenas: participação política no Rio Negro
Claudina Azevedo Maximiano

O presente texto propõe uma reflexão inicial sobre o processo de participação política dos jovens indígenas no rio Negro, a partir da análise das iniciativas de mobilização/organização de um “novo sujeito político” no cenário do movimento indígena e do contexto social da referida região. O objetivo dessa reflexão é descrever o processo de articulação/mobilização de jovens indígenas na luta por espaços sociais de poder e apresentar, a partir desse contexto, o surgimento de um discurso em torno de um sujeito pluriétnico, autodenominado como “adolescentes e jovens indígenas”. Tal reflexão perpassa o contexto social do município de São Gabriel da Cachoeira, com destaque para Santa Isabel do Rio Negro, município localizado na região do Médio Rio Negro, campo em que se circunscreveu a pesquisa por meio da qual se construiu esta reflexão. A temática está ligada aos problemas sociais que envolvem os jovens indígenas e as iniciativas de organização, acrescida dos conflitos vivenciados por eles, ações classificadas como “marginais” e/ou a mobilização por políticas públicas específicas que acabam por se conectar e/ou se tangenciam no cotidiano.

Flores and ‘Tijeras’: a feminist revindication of Quechua and Indigenous women through a fusion of Andean-trap music
Priscila Alvarez-Cueva e Sofia Sousa

This article explores the song ‘Tijeras’, by Renata Flores, with the aim of identifying how the narrative of the message is constructed in the song, what elements accompany the representation and how they dialogue. To do this, the authors carry out an in-depth reading (Buonanno, 1999) where they identify five areas that allow us to understand the song as a weapon of protest and vindication, not only of indigenous women but also of the quechua language. In doing so, the article discusses the fusion Renata Flores makes between the mountains, the street, and the musical genre, while promoting a feminist message of union to face gender violence. In addition, the authors discuss the difference in cosmopolitanism that the artist projects, which in turn vindicates the representation of the indigenous Quechua-speaking woman. In general, the results suggest that the song ‘Tijeras’ contributes to the oral and musical transmission of Quechua, while promoting revolutionary and feminist ideals that connect with young audiences, to encourage identification processes that contribute to the elimination of violence against women, in general, and minority groups such as the indigenous, in particular.

Registos de Pesquisa

Simon Contra: etnografias de um jovem artista
Henrique Grimaldi Figueredo

Com uma mente complexa e falas atravessadas pela velocidade e pelo caos cultural que configuram o mundo visual contemporâneo, Simon Contra é um exímio exemplo de um jovem artista criando e circulando pelo campo da arte. Através dessa etnografia, uma conversa aberta e colaborativa onde as perguntas atuam mais como provocações que esperam recolher respostas apropriadas, buscamos prover um retrato impreciso da juventude criativa e de seus modos de enfrentamento no campo cultural. Orbitando entre a descrença no sistema da arte e a esperança de que os artistas e seus públicos possam galgar os verdadeiros termômetros de consagração, essa conversa com Contra torna-se elucidativa sobre o imaginário social e as estratégias de sobrevivência no acirrado espaço mercadológico e institucional da arte da atualidade.

Recensões/Resenhas

Recensão ao livro de António Damásio, A Estranha ordem das Coisas: a vida, os sentimentos e as culturas humanas
Luís Carlos S. Branco

Recensão ao livro de António Damásio, A Estranha ordem das Coisas: a vida, os sentimentos e as culturas humanas