Apresentação

Paula Guerra e Lígia Dabul

O papel da criatividade nos ecossistemas artístico-musicais. Uma antecâmara

 

Artigos

A dimensão social e cultural de ‘platforming’ da música ao vivo: o caso da cena musical independente de Hong Kong durante a pandemia de COVID-19

François Mouillot e Sofia Sousa

Este artigo explora as implicações do aumento das atuações de música ao vivo digitalmente mediadas no contexto de uma cena cultural marginalizada, nomeadamente a cena musical independente de Hong Kong, durante a pandemia de Covid-19. Combinando a observação de eventos com entrevistas a atores-chave dentro da cena, este artigo analisa os processos pelos quais a platforming parcial das atividades de música ao vivo levou a processos de (des)territorialização e (re)territorialização – através das colaborações entre alguns atores de música indie de Hong Kong e outros internacionais -, proporcionando a reafirmação do local, através do uso de representações visuais da cidade em concertos online, bem como o fomento de formas de desvinculação digital. Por sua vez, o artigo argumenta que as análises sobre a platforming da música devem ter em consideração os efeitos sócio-culturais das plataformas digitais em contextos específicos de criação e consumo cultural, tais como as cenas culturais.

 

Ainda uma vez, Bob Dylan

Marina Marins Morettoni e Luis Carlos Fridman

O artigo discute a distinção entre a “cultura de elite” e a “cultura de massa”, a partir do Prêmio Nobel de Literatura concedido a Bob Dylan pela Academia Sueca em 2016. Nessa apreciação, aborda variados aspectos da trajetória artística de Dylan e examina a importância de sua obra na cultura musical e poética norte-americana, com destaque para a influência da literatura beat e dos trovadores que o antecederam, portadores de uma visão crítica da vida do país. Nessa abordagem, analisa o tratamento conferido por Theodor Adorno ao jazz e à música popular diante da repercussão e da densidade da obra de Bob Dylan, que lhe valeu a premiação do Nobel de Literatura.

 

‘The Great Work of Contemporary Art’ and ‘The Great Curator’: Authorial Curatorship at The Bienal de São Paulo (1985 and 1987)

Tálisson Melo de Souza

This essay focuses on two editions of the Bienal de São Paulo organised by Brazilian art critic Sheila Leiner, in 1985 and 1987, as a key context to analyse the consolidation of exhibition curatorship within the Bienal’s structure and Brazil’s contemporary art circuit. Built on the analyses of Leirners curatorial projects, I reflect on how and with which implications the conditions and repercussion of these exhibitions may indicate or have affected the direction of the Bienal, structuring its bases to the following globalisation process that circumscribed the shaping of contemporary art biennials.

 

Chameleon identity of rock music. Careers, employability, and DIY in Portugal

Ana Martins

We know that currently, time is liquid and contemporary society is constantly changing. What is new today, tomorrow will cease to be, and it is up to us as a society to develop the ability to adapt to all these transformations that occur at all levels of our social life. In this sense, the recent field of the so-called creative industries has also undergone several transformations, especially with regard to music and the different ways in which it is interpreted and socially perceived by us. If, once, recording a record was the culmination of a lot of effort and hard work of a band or performer, nowadays with the technological evolution there are a lot of artists who can do it without leaving their home. And consequently, these transformations bring with them new ways of making music, as well as new roles for artists. However, will this adaptation to new social, economic, cultural and technological contexts be an easy task? And in what way(s) do musicians or performers experience this need for transition and adaptation? Also in Portugal, artists face all these issues and changes in the music field. So, they need to find strategies that help them to develop a chameleon identity necessary to provide continuity to their professional careers in the contemporary and challenging music industry. In this paper the methodology used is based on a documentary analysis (and consequent categorical content analysis) of different media and authors based on a collection of secondary and primary information – analysis of first-hand interviews.

 

751 Dias: um ensaio de memória líquida. Abordagem da programação cultural de Paulo Cunha e Silva

Carlos Pinto

À luz da abordagem dos principais conceitos dos estudos contemporâneos de memória, estudaremos o perfil de Paulo Cunha e Silva, as suas linhas de programação cultural e as políticas culturais implementadas ao longo dos 751 dias em que assumiu o pelouro da cultura do Município do Porto. Tomaremos como corpus de análise as notícias / entrevistas / crónicas / editoriais que o evocam no intervalo temporal referido e publicadas online pelo Jornal Público e respetivos suplementos P3 e Ípsilon. Recorrendo à análise de conteúdo categorial dos dados recolhidos nestas publicações online, far-se-á um estudo exploratório que relacione as linhas mestras de trabalho transdisciplinar de Paulo Cunha e Silva com o legado de uma memória cultural e de uma cidade líquidas.

 

Jazz-Off. A revolução de Jorge Lima Barreto

André Quaresma

25 de Abril de 1974 é o dia que ficou marcado como o da revolução em Portugal, mas toda a década de 1970 transporta o sentimento revolucionário. Esta constatação pode ser feita numa análise às diversas formas de expressão literária ou artística da década onde os discursos e temáticas espelham o sentimento dos autores e consequentemente da época. Jorge Lima Barreto destaca-se neste contexto, para além do discurso fortemente revolucionário, torna-se um dos maiores responsáveis pela introdução do Jazz em Portugal, e apresenta-o como estética de revolução, nascida das raízes africanas dos escravos americanos e apresentada ruidosamente como oposição ao colonialismo do regime. Lima Barreto cria uma estética de Jazz Conceptual, devidamente sustentada pela sua análise teórica e implementação prática num projeto denominado de Anar(quista) Band. A instrumentação vanguardista (com sintetizadores, registos concretos e pianos preparados) aliada a técnicas de composição indeterminísticas do minimalismo da Escola de Nova Yorque, a utilização dos processos orientais do budismo zen ou das viagens do psicadelismo americano, o registo áudio em lançamentos de edição bastante zelosa e o registo notacional com qualidades estéticas plásticas muito para além das notacionais; todas estas características tornam o trabalho de Jorge Lima Barreto nesta década fundamental para a compreensão da produção de estéticas experimentais de Portugal pós 25 de Abril.

 

Distanciar para compreender em tempos de crise: o cinema de ficção científica e o documentário sob o viés do estranhamento cognitivo

Deborah Lemes Ribeiro

Para a academia cabe a tarefa de abstrair, registrar historicamente, entender e suscitar reflexões, principalmente, em momentos de crise como o que vivemos no momento. Assim, apresentamos neste estudo uma tentativa de compreender como os gêneros cinematográficos da ficção científica e documentário se relacionam com este tempo pandêmico, na medida que a busca por estes gêneros tem se intensificado. Amparados por referenciais científicos, teorias basilares, apresentamos a história de ambos os gêneros, enquanto potencializadores de olhares críticos, localizando sua relação com períodos de crise. A constatação da arte, neste caso estudado, do cinema, como recurso de conscientização e transformação, está relacionada com um movimento dialético de estranhamento cognitivo, que inclui o processo de deslocamento do espectador de seu cotidiano, cujo distanciamento possibilita reflexão, ampliação e compreensão da sua realidade.

 

Registos de Pesquisa

Repensar as estratégias de literacia mediática e digital: Intencionalidade cívica aliada ao civic design

Daniela Ferreira da Silva

Nesta breve reflexão pretendemos debruçar-nos sobre as intervenções pedagógicas de literacia mediática e digital. É certo que o ambiente digital facilita a participação cívica, na medida em que oferece espaços de expressão política e artística e dá luz às experiências pessoais, mas peca, por vezes, em efetivar uma participação cívica quando se promove uma leitura espetacularizada e superficial da realidade. Numa altura em que vemos brotar centenas de manifestação juvenis nas ruas e nas redes sociais contra a inação política face à crise climática, é necessário que as intervenções pedagógicas sejam aplicadas com um olhar atento no impacto que terão fora da sala de aula. As intervenções devem seguir motivações humanistas, promovendo o contacto ativo com as comunidades e o bem comum.